Logo quando lançado em 2014, o filme Madame Bovary, por Sophie Barthes, recebeu muitas críticas. Sendo até considerado entediante e pouco interessante, carecendo de enredo. Entretanto, a obra de Gustave Flaubert, com nove adaptações para o cinema, significou, no século XIX, o rompimento com todos os bons costumes e tradições até então em vigor na sociedade recatada novecentista.
O filme conta a história de Emma, que como toda mulher da época, sonha em se casar e viver um verdadeiro romance de folhetins. É então que Charles Bovary, um médico atraente e trabalhador, aparece para tornar real seu tão idílico romance. Ou não. Com um marido entediante e constantemente distante, Emma sente-se abandonada e infeliz em sua própria casa. Vivendo o infortúnio do que esperava ser a realização de um sonho juvenil, ela vai em busca de uma saída para seu sufoco.
É nesse momento que Madame Bovary torna-se notório. Para suscitar-lhe vida, Emma, primeiramente, encontra prazer no consumo, para então buscar amor e carinho fora do seu casamento. Torna-se, portanto, uma mulher consumista, mas, acima de tudo, adúltera. — Por esse fato, a obra foi considerada uma ofensa moral, pública e religiosa aos bons costumes pelo Ministério Público francês do século XIX, levando o Flaubert, autor da obra, a julgamento na Suprema Corte.
Infelizmente, homens e mulheres eram tratados de forma totalmente desigual. O adultério masculino era visto como boemia ou uma questão de necessidade, já que a esposa não era capaz de satisfazê-lo. Já o feminino, um pecado. Frente a toda a pressão social, os endividamentos e os infortúnios, Emma recorre ao que acredita ser sua última saída. Um final inesperado para uma mulher sonhadora, cujos ideais eram inconcebíveis para fechada mentalidade da época, que subjugava o papel feminino.
Uma história emblemática, essencialmente por retratar uma sociedade burguesa, materialista e hipócrita, em que o mascaramento da realidade era fundamental para a manutenção de sua estrutura. Madame Bovary não se trata de uma simples história entediante e sem carisma, mas sim, do início do Realismo e o marco da mudança de toda uma mentalidade, trazendo à tona a verdadeira face da sociedade, sem vergonha e sem necessidade para eufemismos. Mas muito além disso, retrata, finalmente, a mulher como um ser humano pensante, com sentimentos, dores e ambições dela própria, uma perspectiva completamente repudiável ao período, quando os direitos femininos eram ínfimos.
Carrega consigo, portanto, um significado muito mais profundo do que se tem à primeira vista. Explora a vastidão de sentimentos da mulher, por tantos séculos abafados, que, a partir desse momento, receberá uma nova visão, um novo papel, caminhando cada vez mais adiante do seu digno respeito e merecimento. Madame Bovary é, logo, o despertar de toda uma sociedade.
É como Gustave Flaubert disse em seu julgamento: “Emma Bovary c’est moi” (Emma Bovary sou eu).
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