Entrevista | A triste realidade dos refugiados em “Human Flow”
Nessa ultima quinta feira, o artista plástico Ai Weiwei estreou seu documentário “Human Flow” na 41ª Mostra Internacional de Cinema São Paulo. O filme trata da migração de refugiados em 23 países do mundo mostrando a realidade e especificidade de cada uma.
Ai Weiwei é um artista, designer e documentarista com forte ativismo social de origem chinesa. Esteve envolvido em obras de grande visibilidade como a construção do Ninho de Pássaro (Estádio Nacional de Pequim). Devido a esse ativismo, acabou sendo preso pelo governo chinês em 2011, como crítico do governo. Desde então ele possui asilo político e tem um estúdio na Alemanha.
Human Flow mostra, através da perspectiva do artista, a realidade dos refugiados que são obrigados a deixar sua terra natal em busca de melhores condições de vida, sobrevivência e liberdade religiosa, política entre outros fatores. Além de retratar o problema politico da migração, no qual os Estados não querem assumir uma responsabilidade nesse quesito, Ai também exprime o olhar do migrante que se vê obrigado a enfrentar situações muito adversas para continuar garantido sua sobrevivência. O documentário não cai na mesma linha de mostrar os Estados que ajudam como salvadores de países de terceiro mundo em colapso e também mostra a qualidade de vida quase desumana oferecida aos refugiados.
Weiwei esteve presente na 41ª Mostra Internacional de Cinema São Paulo no dia 19 de outubro e comentou um pouco sobre sua obra em uma coletiva que participamos e respondeu a algumas perguntas:
O filme abrange diversas realidades. Existe alguma que ficou de fora e que você gostaria de ter em um corte final?
Eu tenho mais 900 horas de material de entrevista, e muito desse material está sendo editado. Eu quero utilizar esse material de alguma forma, não sei ainda se online ou na forma de um livro mas tem muito material ainda que gostaria de trabalhar.
Existe alguma razão principal para você querer tratar da crise de refugiados no mundo?
Eu tinha uma curiosidade entender como 64 milhões de pessoas foram forçados a deixar suas casas. As imagens que eu vi tanto nos campos de refugiados, quantos nos lugares de fronteira e o tratamento dado pela Europa muitas das vezes irrelevante, me chocou muito. Foi isso que me levou ele a registrar essas imagens e fazer esse filme.
Você tem uma função social como artista nesse processo?
O artista se envolver é muito importante. Desde que estava na China já trabalhava com documentários online, em redes sociais e enxergar essas coisas e fazer parte delas é função do artista, é importante se envolver. É deprimente ver um mundo em que os valores essenciais são violados e ao mesmo tempo eu me sinto inspirado a fazer arte.
Você se sente um pouco refugiado vivendo em Berlim?
Eu me sinto privilegiado, mas é claro que é um fato que eu tive que deixar a China e se eu voltar eu posso ser preso a qualquer momento. É uma condição que eu entendo desde sempre porque meu pai foi exilado por 20 anos pelo fato dele ser um poeta e eu entendo esse problema dos refugiados de uma forma muito pessoal. Embora eu tenha o privilégio de não viver nas situações que eu retratei no filme, ainda assim eu não posso voltar para casa.
O que você acha que é mais forte a irracionalidade humana ou podemos ter esperança em um futuro melhor?
Eu não tenho esperança em políticos, grandes companhias ou instituições, porque ele não se importam. Desde que eu terminei de fazer o filme eu sinto que a situação tende a piorar e o mundo deu uma guinada para uma direita conservadora que não se importa com a situação dos refugiados. Mas a esperança que eu tenho e na ação individual eu tenho fé na humanidade como um conjunto de indivíduos que se importam uns com os outros.